O Blog PA publicou artigos do Blog da Veja (e da FSP) do seu correspondente de Paris:
19 de julho de 2009
DIPLOMACIA
Dois pintos no lixo
“Se entendem tão bem como dois pintos no lixo”, assim o tradutor de francês de Lula, testemunha privilegiada das conversas com Sarkozy, descreve a relação entre o presidente francês e o brasileiro. Brasil e França encetaram um namoro firme nos últimos tempos. A relação se intensificou a tal ponto que um diplomata graduado da Embaixada do Brasil em Paris clama por reforço de funcionários no palacete Schneider, construído na 34 Cours Albert Premier, sede da representação brasileira. “Estamos estourando as horas extras, é trabalho sem fim” , diz ele. Desta vez, não se trata só de vagos e enfadonhos intercâmbios culturais, há substância política e negócios pesados na mesa.
Nunca a confluência de pontos de vista do Brasil e da França foi tão estreita, seja no que respeita temas como governança internacional (G20, FMI, Conselho de Segurança da ONU), o apreço por um mundo “multipolar”, aumento no controle dos mercados financeiros, cooperação na aérea de energia nuclear, preservação da biodiversidade e mudanças climáticas. No passado, quando evocava-se a relação entre os dois países, o principal tema era divergências no comercio agropecuário. O Brasil reclamava dos subsídios que o governo francês dava aos seu produtores e das altas taxas de importação de commodities brasileiras. Essa pendenga ainda existe, mas agora foi relegada ao segundo plano.
Em franca perda de vitalidade devido um déficit público monumental (85 bilhões de dólares por ano) e um crescimento econômico pífio (1,18% do PIB em 2008), a França precisa de novos mercados. Eles estão, sobretudo, nos países emergentes. A França não tem influência nem se dá tão bem com a China, que faz o que quer. A Índia sempre foi parceiro tradicional dos inglêses por razões históricas e culturais, e com o fim da Guerra Fria, onde mantinha uma posição de pais não alinhado, mas simpáticos aos soviéticos, aproximou-se agora dos Estados Unidos. A Rússia prefere tratar mais com a Alemanha do que com a França. Sobrou o Brasil para o governo de Nicolas Sarkozy.
É neste contexto que esta previsto para a segunda semana de agosto um parecer técnico, elaborado pela Aeronáutica, sobre a concorrência para compra de 36 aviões caças no valor de 4 bilhões de reais. O Rafale, fabricado pela francesa Dassault Aviation cujo centro de produção em Mérignac tem capacidade de produzir 30 aviões por ano, atende aos requisitos formulados pelo Ministério da Defesa. O maior atrativo não é só o desempenho do avião e adequação as necessidades da Força Aérea Brasileira (FAB), mas a transferência de tecnologia. Os franceses prometem repassar o código-fonte do caça bireator aos brasileiros. A posse da informação permite, por exemplo, fabricar o Rafale no Brasil em quase total independência.
A decisão da compra dos caças, embora passe pelo escrutínio de uma avaliação técnica, é política. Quem decide, no final, é o presidente Lula. Na sua passagem por Paris, falando a respeito dos entendimentos para os modos de financiamento entre um grupo funcionários do Ministério da Fazenda e da Defesa com o governo e bancos franceses, Nelson Jobim deu uma pista. “Queremos que tudo esteja pronto até o 7 de setembro”, disse ele. A data coincide com a visita de Nicolas Sarkozy ao Brasil para inaugurar o ano do seu país no país de Lula. A escolha do Rafale são favas contadas.
Por Antonio Ribeiro - 07:47 | Enviar Comentário | Ler Comentários (2)
18 de julho de 2009
DEFESA
A cobra vai fumar
No dia 16 de julho, Veja.com revelou, com exclusividade, que a viagem de 8 parlamentares brasileiros a Paris foi paga pelo setor aeronáutico francês. A Dassault Aviation fabricante do Rafale, um dos litigantes na concorrência para escolher os 36 novos caças da FAB, no valor de 4 bilhões de reais, foi quem mais contribuiu para cobrir as despesa durante a estadia de uma semana inteira dos congressistas.
Notem bem, quem convidou os deputados foi o governo francês através do Instituto de Altos Estudos de Defesa Nacional (IHEDN). Quem pagou a conta foi o setor privado francês, interessado na concorrência. Os jornais brasileiros talvez por estarem acostumados com tantos despautérios de seus políticos e governantes, deram nota de pé de página.
Esta coluna tem por princípio não reproduzir reportagens de outros veículos de imprensa. Mencionamos, indicamos, fazemos referência. Nosso juízo é o seguinte: se o leitor deseja ler um texto de reportagem do O Globo, por exemplo, ele pode acessar site do jornal, comprá-lo na banca ou fazer uma assinatura. Não se trata só respeito ao direito autoral, mas ao investimento que revistas, jornais, TVs fazem em jornalismo, prática capital para a boa informação e funcionamento da democracia.
Desta vez, no entanto, dadas as circunstâncias, vamos abrir uma exceção. O blog DE PARIS reproduz abaixo um texto muito pertinente do jornalista da Folha de São Paulo, Igor Gielow. Ele aborda a questão da concorrência para compra dos caças e do lobby francês.
FOLHA DE SÃO PAULO, 18 de julho de 2009
O nó dos caças
Por Igor Gielow
BRASÍLIA - Enquanto Nelson Jobim curte suas férias na Europa, no Ministério da Defesa há uma caveira de burro monumental enterrada à sua espera. Trata-se da decisão sobre a compra dos novos caças para a Força Aérea Brasileira.
Na hipótese de a FAB selecionar o preferido de Jobim, o francês Dassault Rafale, o ministro passará um bom tempo explicando os motivos da escolha. Ele terá argumentos, mas o questionamento é certo. Se os militares forem de Gripen (Saab sueca) ou Super Hornet (Boeing americana), o abacaxi será mais espinhoso. Jobim terá de acatar algo contra o que trabalhou até aqui, que é uma parceria em todas as áreas com a França, ou então irá bater de frente com os brigadeiros e forçar a escolha pelo Rafale.
Seja qual for o cenário, é saudável a visibilidade sobre uma disputa de no mínimo uns R$ 4 bilhões — provavelmente muito mais. Em qualquer lugar do mundo, compra militar é coberta por um véu de segredo. Natural: é a segurança do país em jogo. Mas mesmo isso precisa de escrutínio público, e até aqui a FAB fez um trabalho transparente nas etapas de sua seleção. Só que agora é a hora da política, e dos pequenos ou grandes detalhes da negociação.
A revelação (adendo do blog DE PARIS: faltou a menção,"da Veja.com") de que a Dassault pagou para uma comitiva de deputados passear em Paris e ouvir sobre as virtudes do Rafale é desses detalhes. Num país sério, seria um dos grandes, e os deputados teriam de se explicar. Eles não decidem nada agora, mas será o Congresso que terá de aprovar o orçamento da FAB e os prováveis créditos extraordinários para pagar a fatura a seguir. Mas aqui é o Brasil, "pas sérieux", como não teria dito De Gaulle. Temos de ouvir o presidente da Câmara falar em "lobby elegante e saudável". Cabe perguntar o grau de refinamento dos próximos detalhes que podem emergir. E como os afetados irão reagir.
Por Antonio Ribeiro - 06:05 | Enviar Comentário | Ler Comentários (7)
17 de julho de 2009
DEFESA
No cardápio, o Rafale.
O ministro Nelson Jobim jantou ontem, 16 de julho, no Chateau Dassault, propriedade da família que controla o fabricante do caça Rafale, um dos três aviões litigantes, escolhidos pelo Ministério da Defesa, na concorência para renovar a esquadrilha da Força Aérea Brasileira (FAB). O projeto FX-2 prêve compra de 36 aviões , cada um custa entre 100 e 150 milhões de dólares. Jobim vistou antes o Centro de Testes Militares Aéreos de Mont-de-Marsan, no sul da França, onde voou o jato que até hoje, além da França, nunca foi comprado por nenhuma força aérea no planeta. A agenda oficial do ministro não menciona o jantar, apenas "deslocamento para região de Saint Emilion." Informação vaga que permite imaginar até que o ministro iria terminar sua estadia na França visitando os famosos vinhedos da região. Nada sobre o jantar. De novo, there is no free lunch.
Por Antonio Ribeiro - 15:48 | Enviar Comentário | Ler Comentários (5)
TRANSPARÊNCIA PARLAMENTAR
Free lunch
Em Genebra, na União Interparlamentar (UIP), durante intervalo de um encontro sobre transparência legislativa, o presidente da Câmara, Michel Temer, conversou com Veja.com. Certa altura, apresentamos a seguinte pergunta: Não há nenhum constrangimento em representar o Brasil neste evento considerando a situação do presidente do Senado, José Sarney? “Eu estou muito a vontade aqui na Suíça, sou presidente da Câmara”, respondeu Temer.
Documento da UIP que balizou as linhas gerais do encontro entre parlamentares de diversos países sustenta que a “confiança nas instituições públicas é essencial para a democracia. Parlamentos não podem ser apenas transparentes, acessíveis, responsáveis e eficientes, mas eles precisam ser visto dessa maneira."
A assessoria do Presidente da Câmara enviou ao blog DE PARIS o convite do governo francês para visita de uma semana de 8 congressistas brasileiros à Paris. O Presidente do Conselho Administrativo do Instituto de Altos Estudos de Defesa Nacional (IHEDN) que coordenou a visita informou a Veja.com que as despesas dos parlamentares foram pagas pela industrias aeronáuticas francesas, cuja maior parte ficou por conta da fabricante do caça Rafale, a Dassault Aviation.
Em tempo: na França, lobby, o termo inglês que significa a tentativa de influênciar politicos e pessoas derteminantes em uma questão, é palavrão. Os nativos preferem o eufemismo "promoção". Ainda não encontraram um substituto para there is no free lunch, a assertiva de que não existe almoço grátis.
Por Antonio Ribeiro - 05:36 | Enviar Comentário | Ler Comentários (1)
16 de julho de 2009
EXCLUSIVO VEJA.COM
Dassault pagou a maior parte da viagem dos parlamentares.
Entrevistado com exclusividade pela Veja.com, Olivier Darrason, Presidente do Conselho Admisnitrativo do Instituto de Altos Estudos de Defesa Nacional (IHEDN), disse: “Nós coordenamos a agenda dos parlamentares brasileiros na França, oferecemos um almoço, mas quem financiou as despesas da viagem foram as industrias aeronáuticas francesas, cuja maior participação foi da Dassault Aviation.” A Dassault Aviation é a frabricante do Rafale, um dos três caças selecionados pelo Ministério da Desa para renovar a esquadrilha da Força Aérea Brasileira (FAB). O projeto FX-2 prêve compra de 36 aviões — cada um custa entre 100 e 150 milhões de dólares. Leia os posts abaixo.
Por Antonio Ribeiro - 14:27 | Enviar Comentário | Ler Comentários (2)
DEFESA
Instituto francês nega ter pago viagem de congressistas
Sete parlamentares viajaram a Paris — o presidente da Câmara Michel Temer, o líder do PSDB na Câmara, José Aníbal (SP), o líder do PT, Candido Vacarezza (SP), líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), o presidente da Frente Parlamentar de Defesa Nacional, Raul Jungmann (PPS-PE), o vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, Maria Lúcia Cardoso (PMDB-MG) além de Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) e Carlos Zarattini (PT-SP) — onde permanecerm uma semana, do dia 11 ao 16 de julho.
Reportagem do jornal Folha de São Paulo com o título Por jatos França banca viagem dá conta que os “anfitriões” pagaram as passagens e estadia dos deputados no país. Os congressistas foram convidados pelo Instituto de Altos Estudos de Defesa Nacional, IHEDN na sigla em francês. Julien Chaboud, o responsável do IHEDN pela organização da visita dos palarmentares brasileiros, em entrevista a Veja.com, desmente categorimente que o instituto pagou as despesas dos parlamentares brasileiros. "Não mesmo, não pagamos passagens e estadias em hóteis ", diz ele.
Perguntados pela Embaixada do Brasil na França se queriam, como é de praxe, que a imprensa fosse informada da presença deles em Paris, os deputados pediram discrição. A viagem faz parte de um lobby militar francês para venda com transferencia de tecnologia de 51 helicopteros, 5 submarinos — um deles de propulsão nuclear — e de 36 aviões caças Rafale que ainda dependem de um parecer tecnico da Aeronáutica que podem optar pelo F-18 Super Hornet, da americana Boeing, ou o Gripen NG, fabricado pela sueca Saab.
Michel Temer (PMDB-SP) disse que "houve um lobby muito saudável e elegante". Segundo o presidente da Câmara, os franceses estão querendo "sensibilizar" os congressistas brasileiros que assistiram o desfile militar do 14 de Julho como convidados de honra na Tribuna Presidencia, na Praça da Concordia. Temer, que defende a permanencia de José Sarney na presidência do Senado, seguiu para Genebra, onde participa de um seminário sobre transparência parlamentar.
Para o líder do PSDB na Câmara, José Aníbal (SP) não existe lobby. "Não decidimos nada." Detalhe edificante : a compra do equipamento militar envolve o Orçamento da União, votada no Congresso. Uma missão composta por funcionários do Ministério da Defesa e da Fazenda está discutindo com os franceses o modo de financiamento da compra dos equipamentos militares. O custo dos 51 helicópteros, dos 5 submarinos e a construção de uma base para os últimos em Sernambetiba, deve ser anunciado amanhã.