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Mensagem
por Marino » Ter Abr 13, 2010 10:26 am
flerte com o totalitarismo
Fantasma da censura
Recomendações do PNDH abrindo espaço para que imprensa sofra fiscalização, multas, penalidades e até cassação de licença foram duramente criticadas e causaram espanto
Daniela Almeida e Maria Clara Prates
As recomendações do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) para que a imprensa sofra fiscalização, penalidades, multas e até mesmo a cassação de licenças (caso de emissoras de rádio e TV), causaram espanto e mobilização entre associações representativas. Por seu papel de denúncia e muitas vezes de oposição, historicamente a imprensa é um dos órgãos que mais sofrem tentativas de censura. Recentemente, vários casos de fechamento de empresas de mídia e de perseguição a empresários da comunicação foram registrados em países da América Latina com regimes de democracia parcial, como a Venezuela. Mas essa realidade é rara em regimes democraticamente estáveis, como o brasileiro.
Na terceira reportagem do especial sobre o PNDH, especialistas apontam uma série de inconstitucionalidades no programa. Para os juristas, o texto fere o artigo 220 da Constituição brasileira, o qual reza que nenhuma lei pode comprometer a liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social. Isso porque o PNDH sugere alterar o artigo 221 da Constituição, condicionando a outorga e a renovação ao alinhamento da mídia com o programa e prevendo penalidades como multa, suspensão da programação e cassação, caso as empresas não respeitem os conceitos de direitos humanos estabelecidos pelo PNDH.
Maturidade
De acordo com o coordenador da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP Martin de Almeida Sampaio, em uma democracia republicana moderna, o controle da imprensa é feito em primeira instância pelo leitor, que abandona o veículo quando percebe desvios na conduta jornalística, e em segunda instância pelo Judiciário. “O jornalismo brasileiro tem maturidade. Todas as vezes em que vimos algum desvio, aquele que se sentiu atacado recorreu à Justiça. A liberdade de imprensa precisa ser regulamentada, mas não censurada. A Constituição é clara no direito da honra. Se sou prejudicado, pleiteio o que é meu de direito.”
Com a derrubada da lei de imprensa, em abril do ano passado, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), acadêmicos e estudiosos do assunto reclamam a falta de legislação para o tema. Editada em 1967, durante a ditadura militar, o texto previa inclusive a prisão de jornalistas. Com a revogação da lei, a mídia passou a ser julgada pelos códigos Civil e Penal, e pela Constituição. Para Paulo Roberto Cardoso, mestre em direito pela UFMG e doutorando em filosofia do direito, o PNDH se aproveita de uma ausência de controles na tentativa de tentar impor um controle ideológico. “Com jornais e jornalistas sob o controle do Judiciário, acontecem episódios de veículos submetidos a censura judicial. O ideal é que o Legislativo votasse uma lei democrática de imprensa. A situação atual é a judicialização da política. Mas o controle ideológico é tão nocivo ou mais que a Lei de Imprensa da ditadura.”
Outra recomendação polêmica do PNDH é a de suspender patrocínio e publicidade oficial em meios que veiculam programações atentatórias aos direitos humanos. Na prática, a medida se traduz na censura econômica à mídia. “É uma tentativa de asfixiar os jornais”, avalia o advogado especialista em direito da comunicação, Manuel Alceu Affonso Ferreira. “O perigo disso tudo é que o programa está em um decreto presidencial. Basta haver a mobilização do governo e da bancada governista no Congresso para essa matéria passar pelo Legislativo.”
Mesmo entre parlamentares da base governista a polêmica em torno do tratamento dedicado ao tema imprensa no PNDH é a mesma. Na semana passada, o senador Aloisio Mercadante (PT-SP), contou em sua página no Twitter que, ao participar de audiência pública no Senado ao lado do ministro Paulo Vannuchi, fez questão de registrar: “O controle social e democrático dos meios de comunicação é o leitor nos jornais, o ouvinte nas rádios e os telespectadores nas TVs”. Mercadante ponderou ainda que, apesar de considerar injusta a oposição de alguns veículos em relação ao governo, é imprescindível que eles existam.
Mas, talvez, o ponto mais contundente do PNDH em relação à mídia seja “o estabelecimento de critérios de acompanhamento editorial a fim de criar um ranking nacional de veículos de comunicação comprometidos com os princípios de direitos humanos, assim como os que cometem violações”. Segundo Ricardo Pedreira, diretor-executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ), a criação do ranking afronta a liberdade de expressão, pois funciona como a criação de uma cartilha. “Se você não reza de acordo com essa cartilha, corre o risco de ser punido.”
Debate
Para Sampaio, o ranking estabelece categorias, logo, afere valores. E o problema dos valores, caso não sejam atingidos, pode resultar em censura. “Você cria um alinhamento natural ao governo. Quem deve gerar esse ranking é a própria população. Essa é uma forma ‘policialesca’ de tentar censurar. Um centro de poder estabelecido fora das instituições.”
Por meio de nota oficial, divulgada em janeiro, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) manifestou seu apoio ao programa. De acordo com a Fenaj, o PNDH é “resultado de uma conferência nacional e do debate público e democrático de diversos segmentos da sociedade, constituindo-se em significativo avanço para o aperfeiçoamento da democracia no Brasil”. O argumento de representatividade, no entanto, é rebatido por Sampaio. Ele questiona ainda a definição de direitos humanos colocada pelo PNDH. “Que definição é essa de direitos humanos? Segundo a Secretaria de Direitos Humanos, o programa foi discutido com 14 mil pessoas. Isso é representativo em um país com milhões de habitantes? Questiono esses movimentos que estavam presentes e quem eles representam. E a reação imediata da sociedade demonstra isso. Essa amplitude do programa que discute desde a revisão da anistia até tributação muda a natureza de um plano que são ideias e princípios a determinações programáticas de um modelo de governo.”
"A reconquista da soberania perdida não restabelece o status quo."
Barão do Rio Branco