Chávez, o oligarca
Os resultados das eleições regionais de hoje definirão o futuro do regime chavista na Venezuela. Em qualquer país governado há quase dez anos por um presidente que tem um índice de popularidade de 62%, a conquista, pela oposição, de alguns Estados ricos e populosos seria um contratempo para ele - no caso de Chávez, isso seria um desastre. Em primeiro lugar, porque isso destruiria de vez a imagem do caudilho imbatível nas urnas - ameaçada nas últimas eleições presidenciais, quando o candidato de uma oposição esgarçada e desunida teve expressivos 40% dos votos, e abalada no ano passado pela derrota no referendo que o transformaria em presidente vitalício. E, em segundo lugar, mas não menos importante, porque é a partir do controle dos Estados que Hugo Chávez pretende ressuscitar a constituição bolivariana - que transformava a Venezuela num país socialista, sem capitalismo e iniciativa privada, além de permitir a reeleição indefinida -, que os eleitores repudiaram.
A ditadura bolivariana de Chávez em nada difere das típicas ditaduras caudilhescas latino-americanas. Instituída para sanear costumes políticos deteriorados, colocar as riquezas do país a serviço do povo e modernizar as instituições e a economia nacionais, em pouco tempo ela se transformou em tudo aquilo que dizia combater. As instituições do Estados foram colocadas integralmente a serviço do caudilho e de sua família. Os setores produtivos foram devastados pelo arbítrio que tem caracterizado a passagem para o "socialismo do século 21". O dinheiro do petróleo financia as aventuras internacionais de Chávez, o consumo de bens de luxo importados pelos apadrinhados do sistema - a Venezuela bolivariana é uma importante importadora de carros de luxo, de jóias e relógios caros e de bebidas finas - e tem pago as importações de gêneros alimentícios de primeira necessidade, que o país não mais produz. O descontrole dos gastos públicos - um aumento de 60% em termos nominais, este ano - produziu, também, uma crescente inflação que corrói a renda da população.
As oligarquias tradicionais, por sua vez, foram substituídas por oligarquias chavistas, que governam seus Estados como se fossem suas fazendas. A família Chávez, como mostrou reportagem de Ruth Costas, publicada na edição de sexta-feira do Estado, há oito anos controla o Estado de Barinas. O pai de Hugo Chávez é o governador; o irmão Argenis é secretário de Estado; o irmão Adán é candidato ao governo do Estado; o irmão Aníbal é prefeito de Sabaneta; o irmão Nacho é candidato à prefeitura de Bolívar; e o irmão Adelis controla os recursos do Estado de Barinas. Em Sabaneta, a família morava numa casa de piso de terra. Mudou-se, depois, para uma casa de 45 metros quadrados em Barinas. Mas isso foi no tempo em que precisava trabalhar para viver mal. Hoje, a família é proprietária de 17 fazendas, num total de 35 mil hectares. É esse o socialismo de Hugo Chávez. Um socialismo feudal.
No início do ano, o caudilho recebeu uma pesquisa que indicava que o chavismo não conseguiria fazer mais do que 12 dos 22 governadores a serem eleitos neste domingo. Sua popularidade continuava grande, mas o prestígio de seu governo, de seu partido e de seus seguidores declinava rapidamente. Decidiu, então, transformar as eleições regionais em um pleito plebiscitário. Os venezuelanos escolherão governadores, prefeitos, deputados estaduais e vereadores, mas o Partido Socialista Unido da Venezuela montou uma campanha como se tivesse para todos esses cargos um único candidato: Hugo Chávez.
Durante meses, Hugo Chávez percorreu o país em campanha eleitoral, inaugurando obras, lançando pedras fundamentais e distribuindo presentes aos eleitores e ameaças aos candidatos de oposição. A oposição, por sua vez, conseguiu unir-se e apresentar candidatos únicos para 90% dos cargos em disputa. Mas não contou com os enormes recursos financeiros e o irrestrito acesso ao rádio e à televisão de que dispôs Hugo Chávez. As últimas pesquisas de opinião indicam que a oposição pode conquistar o governo de 6 a 8 Estados. Se ficarem com os Estados de Zulia, Miranda e Carabobo, os mais ricos e populosos do país, além da prefeitura de Caracas, e se destronarem os Chávez em Barinas, os oposicionistas terão condições objetivas de impedir o avanço do chavismo e de, nas eleições parlamentares de 2010, quebrar o controle de Chávez sobre as instituições nacionais.
Fonte: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje ... 2095,0.php