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Mensagem
por piratadabaixada » Sex Mar 23, 2007 10:27 am
Orçamento da Defesa pode subir para R$ 10 bi
Daniel Rittner
O governo concluiu um audacioso plano de reaparelhamento das Forças Armadas em que prevê investimentos de até R$ 16 bilhões para a aquisição e modernização de equipamentos militares. O plano pressupõe a ampliação do orçamento anual do Ministério da Defesa para R$ 10 bilhões - o que inclui despesas de custeio - e define prioridades na compra de armamentos.
Está prevista, por exemplo, a retomada do Projeto F-X, de aquisição de novos caças para a Aeronáutica, com despesa de US$ 1,1 bilhão entre 2008 e 2012. Trata-se de um investimento superior aos US$ 700 milhões estimados anteriormente para a compra dos aviões, que foi interrompida oficialmente em fevereiro de 2005.
Excluindo despesas com pessoal, o ministério recebeu R$ 6,6 bilhões para gastar neste ano, somando custeio e investimentos, mas a verba diminuiu para R$ 5,3 bilhões após o contingenciamento. Ou seja, a recomendação é praticamente dobrar o orçamento da Defesa. Após quase dez meses de discussões, porém, o grupo de trabalho formado para discutir o assunto chegou a um impasse: o Ministério do Planejamento e a Casa Civil deram sinal verde, mas a Fazenda discordou do aumento dos recursos para R$ 10 bilhões por ano. Com a exposição da divergência no relatório final do grupo, o assunto será decidido em breve pelos ministros.
Cada comando militar definiu suas prioridades, explicitando uma ordem de importância a cada projeto, e submeteu-as à avaliação do grupo. O relatório final prevê R$ 7,7 bilhões para atender às prioridades da Aeronáutica até 2012, R$ 4,3 bilhões para a Marinha até 2011 e R$ 4 bilhões para o Exército até 2009. Como o grupo trabalhava com a hipótese de início dos gastos ainda em 2006, quando promoveu suas discussões, o cronograma teria que passar agora por leve ajuste.
A defasagem tecnológica e a necessidade de reaparelhamento das Forças Armadas tiveram ênfase nos discursos de posse dos novos comandantes militares, nas últimas semanas. O almirante Júlio Soares de Moura Neto, que tomou posse no dia 1º de março, afirmou que a Marinha está "perdendo a capacidade operacional" e descreveu a situação como "insustentável". Ao transmitir o cargo para o general Enzo Peri, o ex-comandante do Exército, Francisco Albuquerque, também tocou no assunto. "No presente período, os recursos à disposição da Força não foram, é óbvio, suficientes para superar o desgaste de décadas", disse Albuquerque.
O tenente-brigadeiro Juniti Saito, que assumiu a Aeronáutica no fim de fevereiro, sinalizou com a retomada do processo de compra de novos caças, conhecido como Projeto F-X. Foi aberta uma concorrência internacional em 2001, com valor estimado de US$ 700 milhões, que trouxe ao Brasil promessas de transferência de tecnologia e fortes lobbies.
Na licitação, quatro grupos chegaram à fase final do processo: o consórcio franco-brasileiro Embraer-Dassault, a americana Lockheed, o grupo anglo-sueco Saab e o russo Sukhoi. Na análise técnica-operacional da Força Aérea Brasileira (FAB), o Sukhoi-35 despontou como favorito, mas a concorrência foi colocada na geladeira pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sua primeira semana de governo e encerrada formalmente em 2005.
Agora, o F-X deverá ser retomado, sem a necessidade de uma licitação formal. Os russos continuam com alguma chance, mas uma nova geração de caças ganhou escala industrial nos últimos anos e tornou defasadas a maioria dos aviões oferecidos anteriormente. O preferido de boa parte da cúpula da Aeronáutica é o francês Rafale, da Dassault, cujas unidades de série só começaram a ser entregues em 2004. Hoje custam em torno de US$ 70 milhões por avião. Uma alternativa ao Rafale, também considerada pela FAB mas com menos entusiasmo, é o Eurofighter Typhoon, fabricado por um consórcio europeu - Reino Unido, Alemanha, Itália e Espanha.
O novo relatório do governo prevê dotação orçamentária para a compra dos caças e reserva US$ 10 milhões para o início do pagamento, em 2008. Em 2009 a verba sobe para US$ 157,9 milhões. Os recursos aumentariam para US$ 300 milhões em cada um dos dois anos seguintes. Em 2012 seria quitada a última parcela do financiamento, com US$ 332,1 milhões. O valor total da aquisição é de US$ 1,1 bilhão - aproximadamente 50% mais caro, portanto, que o F-X original.
Apesar da importância atribuída ao projeto pela Aeronáutica, a compra dos novos caças é a segunda prioridade na lista de ações sugeridas pela Força. A primeira é o término do Plano de Recuperação Operacional da FAB (Profab), com aquisições já realizadas e modernizações em andamento. Fazem parte do Profab, por exemplo, a compra de aviões de transporte de tropas e de cargas Casa-295 da Espanha, a aquisição de caças Mirage 2000C usados da França e a modernização dos F-5 pela Embraer. Também está na lista a ampliação da frota de turboélices C-98 - o modelo Caravan utilizado pelo Correio aéreo Nacional - para transporte de cargas leves e de passageiros entre pequenas distâncias, principalmente na Amazônia.
Originalmente previsto para terminar neste ano, o Profab teve a sua conclusão estendida para 2012. A prioridade máxima dada ao programa explica-se por causa do custo adicional que o refinanciamento de dívidas teria se faltarem recursos para o pagamento das compras realizadas.
Na segunda prioridade da Aeronáutica, ao lado do F-X, está a aquisição de mais 12 jatos para aumentar a frota destinada ao transporte de autoridades. O plano aponta a necessidade de compra de oito aeronaves Phenom 300 e de quatro ERJ-135, ambas fabricadas pela Embraer, mesmo após as críticas feitas durante a campanha presidencial à aquisição do Airbus 319 da Presidência da República - o "AeroLula".
A terceira prioridade da FAB é a execução do Projeto CT-X, para fabricação de um novo turboélice que substituirá os Bandeirantes da frota atual. Com uma encomenda inicial de pelo menos 50 aeronaves, o projeto tem um custo estimado em US$ 300 milhões e pretende impulsionar a indústria aeronáutica no país. Bimotores simples e sem trem de pouso retrátil, as aeronaves terão tecnologia estrangeira, mas serão montadas com mão-de-obra brasileira e incluirão peças nacionais, tornando-se sucessoras do Bandeirante, com uso potencial, inclusive, na aviação civil.
O Exército definiu suas prioridades de maneira bem mais fragmentada, com uma lista que contempla a compra de blindados, viaturas operacionais e sistemas de defesa anti-aérea. Para atender à principal prioridade da Força, o relatório diagnostica a necessidade de alocar R$ 1,9 bilhões para investimentos no período 2006-2009. As demais ações previstas incluem, entre outras, a integração dos sistemas de comunicação do Exército e a aquisição de mais helicópteros.
Na Marinha, o programa de reaparelhamento se concentra no período 2006-2011, mas prevê ações complementares por mais 15 anos. A maior prioridade é dada à compra de seis submarinos convencionais, ao ritmo de um por ano, bem como à modernização dos cinco submarinos que já compõem a frota da Marinha. No ano passado, a Força anunciou a encomenda de um submarino Ikl-214 para o estaleiro alemão ThyssenKrupp MS.
Para sair do papel, o aumento dos recursos para a Defesa e a viabilização do programa de reaparelhamento das Forças Armadas depende de um aval do presidente. Aguarda-se para breve uma reunião ministerial para fechar o assunto e levá-lo a Lula, embora o assunto tenha ficado momentaneamente parado por três fatores: o apagão aéreo, a troca de comandantes militares (e provavelmente do ministro da Defesa) e a formatação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
País corre risco de perder liderança militar na região
De Brasília
Se não aumentar rapidamente seus investimentos no reaparelhamento das Forças Armadas, o Brasil perderá a liderança sul-americana na área militar em um prazo de dez anos. Esse prazo seria suficiente para permitir que a Venezuela, o Chile e até mesmo a Colômbia consigam reunir arsenais de armamentos, frotas de caças, navios e submarinos mais poderosos e modernos que o Brasil.
A advertência é do professor Expedito Bastos, pesquisador de assuntos militares da Universidade Federal de Juiz de Fora, que vê uma estreita relação entre perda de poder militar e diminuição da influência política brasileira sobre seus vizinhos da América do Sul. Bastos nota que, entre os países que se candidatam a um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, o Brasil tem a menor liderança militar para a região que pretende representar. Alemanha, Japão, Índia e África do Sul também pleiteiam vaga de membro permanente em uma futura reforma do conselho da ONU.
No ano passado, a Venezuela de Hugo Chávez encomendou 24 Sukhoi-30 (uma versão anterior aos SU-35 oferecidos ao Brasil no Projeto F-X) à Rússia. Eles vão substituir antigos caças F-16 americanos. Os primeiros aviões já chegaram ao país vizinho. Outros 12 a 16 aviões F-5 serão modernizados pelo Irã, outro parceiro preferencial de Chávez, que também comprou helicópteros russos e pode investir cerca de US$ 3 bilhões para transformar a Marinha venezuelana na mais poderosa da América do Sul.
Motivo de preocupação assumida da Casa Branca, a aquisição de 100 mil fuzis Kalashnikov também assusta o Brasil, alega Bastos. "O que preocupa é o fato de que a Venezuela está instalando uma fábrica para produzir os fuzis, que poderão cair nas mãos de guerrilheiros, do crime organizado e até de movimentos sociais radicais, com o potencial de danos sérios ao Brasil", acredita.
Embora o Brasil não tenha se envolvido em conflitos bélicos desde a Guerra do Paraguai (1864-1870), o pesquisador argumenta que o risco de confronto direto com outros países não é a única razão para investir na área militar. Ele lembra que nações vizinhas mantêm disputas territoriais, como aquela entre Venezuela e Guiana, que esquentou nos últimos meses. Para Bastos, modernizar as Forças Armadas é estratégico para evitar problemas como a transferência de guerrilheiros de países vizinhos para a Amazônia brasileira. "Se quisermos preservar a nossa segurança no futuro, resguardar as nossas fronteiras e ter capacidade de influenciar a região, temos que investir nas Forças", observa.
Para o almirante Mário César Flores, ex-ministro da Marinha no governo Collor, um dos desafios para tirar do papel o reaparelhamento militar é convencer a opinião pública sobre a importância desses investimentos.
Ele avalia que os assuntos relativos às Forças Armadas são tratados apenas de forma eleitoral e têm ficado restritos às mobilizações para reajustes salariais. Flores sugere que a sociedade não caia na tentação de pensar que o Brasil não precisa investir no setor devido à sua tradição de pacifismo na arena internacional. "É como desativar o Corpo de Bombeiros na certeza de que não vai haver incêndio", compara.
O almirante teme os recentes "rompantes armamentistas" da Venezuela e adverte que, para manter a paz, o Brasil não pode simplesmente confiar nos outros países. Flores se diz ausente das discussões sobre novos armamentos e tecnologias, mas ressalta um ponto da Marinha. "O que cria angústia é o pouco ou quase nenhum avanço da propulsão naval nuclear", afirma o ex-ministro, referindo-se ao antigo desejo de um submarino atômico.
Além da Venezuela, o Chile está recebendo caças americanos F-16C Falcon, fragatas inglesas, submarinos franceses e tanques de batalha alemães. Quem entrou em cena agora foi a Colômbia, que anunciou compras de US$ 3,6 bilhões, no fim do mês passado. Serão aquisições de aeronaves militares e equipamentos técnicos, além do aumento de 38 mil homens nas Forças Armadas. (DR)