Meus prezados:
21/03/2007 - "Zero Hora" - Martha Medeiros
Difícil decolagem
O pior desastre aéreo do país - o avião da Gol que se chocou no ar contra um jato Legacy - aconteceu no final de setembro de 2006. O acidente está completando seis meses, também conhecido como meio ano. Desde lá, instalou-se o caos nos aeroportos. Os vôos saem com atrasos impensáveis, isso quando não são cancelados. Nativos e estrangeiros de todas as idades são obrigados a passar a noite dormindo num saguão, acomodados em cima da própria bagagem, perdendo reuniões, conexões, dinheiro e a paciência, lógico. Seis meses. Meio ano. É tempo suficiente para colocar ordem no galinheiro. Qualquer outra república das bananas já tinha tomado uma providência.
Semana passada voei do Rio para Porto Alegre com três horas e meia de atraso - coisinha à toa -, e ainda assim o comandante quase perdeu as estribeiras. Ao cumprimentar os passageiros pelo alto-falante, iniciou pedindo desculpas e tentou explicar calmamente o que gerou o atraso. À medida que ele falava, no entanto, dava para perceber que a calma estava sendo substituída pela raiva, e ele só não terminou o seu discurso aos gritos porque o co-piloto deve ter dado uma situada nele. A explicação era que o avião deveria ter saído de Manaus às 4h da manhã, mas recebeu ordem para esperar uma outra aeronave ir e voltar de Boa Vista. Dá para entender? O avião, no solo, pronto para partir, precisou esperar um outro avião decolar para Boa Vista, em Roraima, e voltar de lá, para só então receber a permissão para cumprir sua rota. Explicação pra isso? Deve haver, mas não pergunte a mim e nem ao comandante, que ficou tão alterado que chegou a dizer: "Estou cheio". Ele não deveria se destemperar diante de um alto-falante, mas não o culpo, porque os funcionários das companhias aéreas também estão sofrendo com este colapso. Eles trabalham todos os dias além do horário previsto e ainda precisam enfrentar a fúria dos passageiros, enquanto os verdadeiros responsáveis por essa anarquia não tomam uma medida enérgica e definitiva.
Em mais uma excelente crônica, o aniversariante da semana, Moacyr Scliar, escreveu ontem um trecho que cheguei a sublinhar, ele disse mais ou menos isso: "Estamos sempre dando explicações aos pais, aos filhos, aos cônjuges, aos chefes, aos clientes, aos amigos, mas a vida tem de ser auto-explicativa. Aquilo que somos e aquilo que fazemos nos explica".
Com mais essa crise vergonhosa e até aqui insolúvel, o Brasil está se auto-explicando para o mundo. Simplesmente atrasados é o que somos.
Um abraço e até mais...
Difícil decolagem
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