Marinha briga com quilombolas
Incra regulariza terra dos herdeiros de escravos que viveram na Ilha de Marambaia (RJ) mas volta atrás no dia seguinte. Procurador denuncia pressão política e militares falam em segurança nacional
Paloma Oliveto
Da equipe do Correio
Em uma casa simples no bairro da Pavuna, na cidade do Rio de Janeiro, dona Henriqueta Barbosa de Lima, 88 anos, sonha com o mar, os rios, as cachoeiras e a areia branquinha da Ilha da Marambaia, lugar onde nasceu, até ser expulsa pela Justiça, há cinco anos. Neta de Dorotéia, escrava fugida sem sobrenome, a remanescente do quilombo fundado à beira-mar foi despejada da casa de taipa e agora vive trancafiada na cidade grande, que só conhece pela janela de casa.
“Ela está triste, não quer sair, nem sabe se locomover no Rio”, conta Bertolino Dorotéia de Lima, 47, filho de Henriqueta. Embora a Superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) do Rio tenha publicado no Diário Oficial da União de segunda-feira o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) do território quilombola em Marambaia, tão cedo Henriqueta não poderá voltar à terra dos seus antepassados. Um dia depois, o Incra-RJ voltou atrás com uma portaria, invalidando a outra publicada.
O procurador da República Daniel Sarmento, que acompanha o caso dos quilombolas de Marambaia, está indignado. Ele afirma que a decisão de suspender a regularização fundiária da área partiu diretamente da ministra Dilma Roussef, da Casa Civil. Ela estaria intermediando o conflito entre quilombolas e a Marinha, que tem uma base na ilha desde a década de 1970 e não reconhece os direitos dos remanescentes. Procurada ontem pelo Correio, a Casa Civil não se manifestou.
Mas, de acordo com pessoas que acompanharam as negociações, a ministra teria chamado a atenção do presidente do Incra, Rolf Hackbart, no dia em que o relatório foi publicado. Ela teria considerado insubordinação a publicação no Diário Oficial e ordenado que os recursos federais destinados ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, órgão ao qual o Incra é vinculado, fossem suspensos até o relatório ser invalidado. A contragosto, Hackbart foi obrigado a determinar ao superintendente do órgão no Rio de Janeiro, Mário Lúcio Machado Melo, a publicação da nova portaria. Melo chegou a dizer que não assinaria o documento.
O Correio entrou em contato com a assessoria de imprensa da Marinha, que enviou um fax assinado pelo capitão-de-mar-e-guerra Paulo Maurício Farias Alves, diretor do Centro de Comunicação Social. No documento, é informado que a Casa Civil é quem está conduzindo o assunto. Já a Casa Civil repassa para o Incra a responsabilidade de comentar a questão. Por meio da assessoria de imprensa, o Incra informou que a portaria foi “tornada sem efeito por ter sido publicada indevidamente”.
“Ainda não estão concluídas as avaliações por parte do governo federal que permitam a solução definitiva da regularização do território quilombola. Há entendimento comum entre os diversos órgãos do governo envolvidos sobre a legitimidade da regularização e titulação desse território. No menor prazo possível serão adotadas todas as medidas necessárias”, informou o Incra, em nota divulgada ontem.
“Em pleno estado de direito, dá-se prioridade aos interesses militares em detrimento dos direitos humanos”, critica Daniel Sarmento. Um decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2003 reconhece o direito dos quilombolas à terra que ocupam tradicionalmente. Na avaliação do procurador, os interesses da Marinha foram sobrepostos à própria vontade do presidente da República. Os militares alegam que a ocupação da ilha envolve a segurança nacional e é local apropriado para o treinamento de tiros. Daí a necessidade de manter a área sob controle militar.
"Em pleno estado de direito, dá-se prioridade aos interesses militares em detrimento dos direitos humanos"
Daniel Sarmento, Procurador da República
Comunidade critica governo
Os quilombolas garantem que, desde a instalação da base da Marinha na ilha, sofrem intimidações e são impedidos de ter acesso a serviços básicos, como saneamento e luz elétrica. A situação foi comprovada pelo procurador Daniel Sarmento que, há pelo menos cinco anos, cuida do caso. “Os quilombolas estão absolutamente decepcionados com o governo federal”, lamenta Rosa Peralta, da ONG Observatório Quilombola.
A ilha tem 1,63 mil hectares e começou a ser ocupada por ex-escravos há 150 anos. No local, hoje os quilombolas sobrevivem da pesca. A convivência com a Marinha chegou a ser comemorada, em 1971, pelas comunidades que ficariam mais protegidas. Porém, desde 1998, os militares recorrem à Justiça contra cada uma das 281 famílias, pedindo reintegração de posse. Um desses moradores é dona Henriqueta. A neta de escravos que costumava caminhar na praia todos os dias está perdendo as esperanças de voltar ao lugar onde nasceu e viveu por 85 anos. (PO)
Quer dizer,uma bando de idosos descendentes de escravos que TOMARAM aquelas terras.............querem reclamar direito sobre uma terra que não é deles !!!
Mas sempre existem interesses por baixo do pano ! Essas pessoas ignorantes estão sendo manipuladas para depois venderem as terras a preço de banana para mais uma desses ONGs vagabundas e ordinárias que infestam esse país :
Rosa Peralta, da ONG Observatório Quilombola.
A Marinha tem que minar tudo aquilo e atirar pra matar quem se artever a entrar na área.